domingo, outubro 31, 2010

"Todos os Outros"




Dizer que Alle Anderen (2009, “Todos os Outros” na tradução portuguesa), de Maren Ade, faz jus aos cânones de Ingmar Bergman, como li, é algo que não posso comentar porque conheço pouco do realizador de O Sétimo Selo. Mas dizer que Todos os Outros é evocativo do magnífico L' Avventura, de Antonioni, como também li, é francamente enganador.

Todos os Outros conta, em duas horas, o que podia ser contado em meia numa curta metragem bem feita. Aliás, "contar" não é para aqui um termo acertado, pois Todos os Outros não conta quase nada, o que, admito, possa ter sido intenção de quem filma.
Mas se não se quer contar nada, o que sobra? A contemplação, a meditação, os diálogos, o belo visual?

No caso, não sobra quase nada.

Por um lado, porque Maren Ade se serve repetidamente de longos planos em que nada acontece e em que, ao contrário do que acontece nos filmes de Antonioni, os actores não têm um papel importante (culpa do realizador e não dos próprios) – é que em Antonioni, mesmo nos planos mais demorados, quase silenciosos, há um trabalho de representação e expressividade intenso do actor (nos gestos, na expressão facial, no movimento do corpo propriamente dito, na forma como se senta, como se coloca de joelhos, etc. etc.).
A par disso, encontramos nesses mesmos planos de Antonioni um profundo e delicado cuidado estético, expresso no formalismo da câmara e da mise-en-scène que esta capta: os actores ao centro, os objectos quase geometricamente dispostos em seu redor, os claros e escuros, etc..
Também o imobilismo antonioniano da câmara é aqui trocado pela ligeira oscilação e turbulência da imagem, dando um certo tom documental ao filme.



Por outro lado, os diálogos aparecem-nos pouco mais do que desinteressantes, frios e sem a profundidade e emotividade que planos longos e silenciosos, em close-up sobre os actores, exigem. Acabamos assim por bocejar quando Chris e Gitti são filmados repetidamente falando pouco ou nada e quase sempre para soltar uns desenquadrados "Amo-te" ou "Não me deixes" (a excepção é quando falam do futuro de Chris e das suas hesitações). De tão abruptos são que nos impedem de ajuizar com confiança o tempo de duração (se longa, se recente) desta relação…

De resto, há uma semana de férias na Sardenha, uma relação um pouco imatura (mas quem somos nós para avaliar da "maturidade" das relações dos outros...) e com alguns mal entendidos , personalidades algo dissonantes (ela cool e extrovertida, ele ora frio, soturno e bruto, ora doce e atencioso, embora ambos sem a dimensão dramática e existencialista que Antonioni, para o citar novamente, imprime às suas personagens), vizinhos indesejáveis (nunca se chegando, na verdade, a perceber bem porquê) e pouco mais.



Há, é verdade, uma assumida intenção de filmar o quotidiano, o banal do banal, e que é visível sobretudo nas personagens e no tipo de “acontecimentos” filmados (a caminhada, o jantar com os vizinhos, a cena do encontro na rua com os outros compatriotas alemães, etc.); mas esse quase naturalismo pode ser muitíssimo aborrecido quando o Cinema pouco mais lhe empresta do que uma câmara de filmar.

Excelente a fotografia (belos shots da Sardenha) e a presença da belíssima Nicole Marischka (Sana, a mulher de Hans).


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