sábado, março 07, 2009

Hable con Ella por André Silva




Apaixonante! Assim posso classificar esta obra do cineasta espanhol Pedro Almodóvar, realizada em 2002. Neste belo filme, a alma feminina é apresentada através do amor profundo de dois homens que, inconformados com a morte cerebral das suas paixões, conversam com elas, acreditando que assim as trarão de volta à vida. Um filme que nos convida, entre sedução e sussurros, a descobrir cada pormenor da própria película em vez de sermos invadidos por conceitos e definições humanas. Simples, genuína, humana, assim é a obra do realizador, que foge ao popular misticismo e cinema ficção a que “infelizmente” estamos habituados. O ponto central do filme é justamente a mulher, vista através do olhar masculino, que leva o espectador a entrar num processo de dramaticidade, culminando num limite extremo, que é o surpreendente fim do filme. Sem duvida um belo filme que, tal como na vida, aborda personagens complexas e relações peculiares, com sentimentos que vão do amor ao desespero, tocando em géneros como o drama, mas também onde se encontram traços de comédia. Onde, a certa altura uma das personagens faz alusão à ideia do feminino emergir do masculino. Uma referência à homenagem de Almodóvar ao cinema mudo, realizada através da introdução de uma cena muda algo surrealista ("Amante menguante") com a lindíssima actriz espanhola Paz Vega, paixão partilhada por duas das personagens, Alicia e Benigno. Quanto à banda sonora, uns parabéns bem merecidos. Musica muito adequada, necessária e impecavelmente relacionada com momentos chave da história. Cena especialmente fantástica com a participação musical do cantor brasileiro Caetano Veloso, com a arrepiante “Cucurrucucu Paloma”. Formidáveis actores, com particular destaque para Javier Camára que interpreta o emotivo Benigno.
Almodóvar aprofunda o conceito de loucura neste filme, uma loucura que se confunde com a normalidade, conferindo mesmo, paradoxalmente, mais encanto a esses seres humanos. Existe uma complexa ligação entre o patológico (Benigno: perverso, violador, "psicopata") e a dita normalidade que se traduz na sensibilidade e na dedicação do mesmo ao seu grande amor, Alicia. Uma loucura que vive paredes-meias e está mesmo na origem dos sentimentos mais autênticos.
A obra de Pedro Almodóvar revela-se comovente, numa técnica própria, e incitando a uma intima relação com o espectador, algo que me surpreendeu bastante. Neste filme, como o título sugere, importa falar (hablar). Não com todas as pessoas, mas nomeadamente com elas, Mulheres. O principal ponto é de facto um convite por excelência a falar (hable): Fale! Baseando-se no princípio que a palavra e a linguagem produz efeitos terapêuticos, o realizador transporta-nos para a necessária dimensão humana onde a comunicação assume um papel fundamental dentro da sociedade. Uma obra que nos faz reflectir….

autor: André Silva

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