quarta-feira, novembro 09, 2011

Mary and Max

Adam Elliot, 2009


Estamos na década de setenta. Mary Dinkle tem 8 anos e vive num subúrbio de Melbourne pintado a sépia. Nos tempos livres, o pai dedica-se à taxidermia, a mãe às chávenas de xerez, e Mary vê os Noblets com o seu galo de estimação enquanto sorve colheradas de leite condensado. 

Do outro lado do oceano, Max Horovitz habita uma Nova Iorque cinzenta, mas à sua margem. Na sua meia-idade obesa e hipocondríaca, Max tem dificuldades em adaptar-se a uma cidade onde imperam os atropelos ambientais e os avanços sexuais, e encerra-se num mundo próprio, rodeado de Noblets -sim, também ele, e receitas hipercalóricas.

Um golpe do acaso fez com que Mary descobrisse a morada de Max numa lista telefónica e decidisse escrever-lhe, dando início a uma longa amizade por correspondência baseada na experiência do próprio autor do filme, Adam Elliot.

A voz de ambos (sendo que a de Max é especialmente bem interpretada por Philip Seymour Hoffman) só vive através das suas cartas - são raros os diálogos neste filme, e é nesta troca silenciosa de palavras que se aprofundam as duas personagens e se desenvolve a temática do filme. A abordagem da doença - Max sofre da síndrome de Asperger, como descobrimos mais tarde, da solidão, da (a)normalidade e, em último caso, da amizade, é feita frequentemente com mordacidade e sem ceder a moralismos - não sendo embora insensível, e é por causa desse tom que não se pode cometer a ingenuidade de confundir filmes de animação com filmes infantis. 

Não significa isto que Mary and Max não nos suscite carinho. Além das personagens, a própria estética do filme é algo de especial. A sensação de que todos os elementos são cuidadosamente escolhidos não é absurda; esta animação foi construída através da técnica de "claymation", uma forma de stop-motion na qual todos os objectos são feitos à mão, a partir de barro ou plasticina, e fotografados frame a frame, para criar a ilusão de movimento (deste género são também conhecidos Wallace e Gromit, ou A Fuga das Galinhas). Desta tridimensionalidade sem linhas rectas resulta o seu aspecto algo descuidado, mas humano e envolvente - não há aqui qualquer trabalho digital. 

É também de referir o salpicar constante de pequenas referências e apontamentos cómicos, contrastantes com o tom predominantemente pessimista do filme e escondidas em sítios tão improváveis como cartazes de sem-abrigo, t-shirts de personagens secundárias, ou mesmo lápides. Os toques de vermelho inseridos na Nova Iorque monocromática, por exemplo, foram inspirados na Lista de Schindler, do Steven Spielberg.

Esta é, afinal, uma história simples, e pode ser bem resumida pelos objectivos de vida de Max: a infância cristalizada nos bonecos dos Noblets, chocolate q.b. (então se forem cachorros...) e um amigo, de preferência não imaginário. 

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